
O Banquete dos Ratos – autor desconhecido
O que há em comum entre a 13ª edição do Fórum de Lisboa, conhecido como Gilmarpallosa, realizado esta semana na capital portuguesa, e o famoso Baile da Ilha Fiscal, a grande e última festa da monarquia brasileira? Guardadas as proporções — Gilmar Mendes está longe de ser comparável ao estadista que foi D. Pedro II —, os dois eventos revelam a mesma ostentação petulante das elites, numa total insensibilidade diante das circunstâncias políticas, econômicas e sociais do Brasil.
A democracia brasileira não está mais ameaçada pelo golpismo de Bolsonaro, ao contrário da monarquia, que foi derrubada seis dias após a requintada festa na Ilha Fiscal. Cento e trinta e três anos depois, uma nova elite — formada por magistrados, políticos e empresários — se reúne em Lisboa no espetáculo grandioso do Gilmarpallosa, expressando o mesmo distanciamento em relação ao mundo real e aos conflitos que assolam o país.
O XIII Fórum de Lisboa reúne quatro ministros do STF (incluindo seu presidente, Luís Roberto Barroso, e o anfitrião do evento, Gilmar Mendes), 13 ministros do STJ, dezenas de parlamentares de diversos partidos — entre eles o presidente da Câmara dos Deputados —, quatro governadores, cinco ministros de Estado, além do procurador-geral da República, Paulo Gonet, o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, seis ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) e vários empresários de destaque.
Com o pomposo tema “O Mundo em Transformação – Direito, Democracia e Sustentabilidade na Era Inteligente”, o que de fato prevalece no encontro são os convescotes paralelos: festas, almoços, passeios e jantares. À promiscuidade de empresas com processos em tramitação no STF participando desses eventos festivos com ministros da mais alta Corte de Justiça, e aos conchavos de políticos a mais de sete mil quilômetros de Brasília, soma-se a falta de transparência quanto ao financiamento do seminário e das viagens dos participantes. Pelo menos seis senadores viajaram com dinheiro público — e nada indica que ministros do STF e outros ilustres convidados tenham custeado, do próprio bolso, sua participação no baile de Lisboa.
Na delícia do verão lisboeta, a elite brasileira saboreou a gastronomia e os bons vinhos portugueses, enquanto conversava, negociava, conchavava e trocava figurinhas em torno de seus interesses corporativos — tão distantes do desenvolvimento nacional. A festa de Lisboa é uma afronta a um país mergulhado em um confronto aberto entre o patrimonialismo do Congresso e o perigoso discurso populista do Executivo. Um país que enfrenta estrangulamento fiscal e carrega mazelas sociais profundas, que atingem a grande maioria dos brasileiros.
Feliz paralelo tirado pelo autor, sem deixar de lado as colossais diferenças, seja entre Gilmar e o imperador às consequências, como o fim do segundo império. O que continua igual é a afronta à paupérrima população.
“Encontro de estroinas” em Lisboa não é indicador isolado da falta de responsabilidade fiscal do Judiciário. Todo dia temos notícia de que o Judiciário se concedeu mais algum privilégio, e os “penduricalhos” que fazem com que magistrados sejam os campões dos supersalários começam a ser conhecidos da população. Decisões administrativas do próprio Judiciário tentam classificar essas verbas extra teto como indenizatórias, mas dentre as centenas de tipos de penduricalhos poucos têm de fato natureza de indenizações por trabalho extra. O resultado é que juízes (e em algumas decisões também desembargadores, procuradores e promotores) em 2025 estão ganhando em média mais de 40% acima do teto, que hoje é de R$46,4 mil (o salário dos membros do STF). O Presidente da Câmara está falando em pautar a reforma administrativa, mas, sem enfrentar a questão dos supersalários, será mais uma frustração, como foi a reforma tributária.
Sucinto mas preciso. Melhor: curto e grosso. Verdadeiro.